CÂNCER DE MAMA TRIPLO NEGATIVO – SABCS 2016

Análise – Dr. José Bines

Em algum momento conhecia-se apenas o vírus da hepatite A e o da hepatite B. Os demais eram chamados de hepatite não-A e não-B. Ao longo do tempo, novos vírus foram identificados e desde então modificou-se a abordagem da prevenção até o tratamento das hepatites. É possível que presenciemos o mesmo em relação ao câncer de mama triplo negativo (CMTN). Uma variedade de doenças é categorizada sob esse rótulo, que diz apenas não haver marcação por imuno-histoquímica dos receptores hormonais (estrogênio e/ou progesterona) e HER-2. Molecularmente, há classificações que começam a vislumbrar subtipos (Lehmann BD. J Clin Invest 2011), mas a tradução na prática clínica ainda é limitada.
Quando considerado como um único grupo, o câncer de mama triplo negativo apresenta algumas características que merecem destaque: maior acometimento de mulheres jovens, risco aumentado, recidivas precoces e sobrevida curta quando elas ocorrem (Foulkes WB. N Engl J Med 2010). Dessa forma, além da instituição de tratamento precoce, há carência de novas terapias que possam melhorar o curso dessa doença.

Dois estudos em CMTN avançado merecem destaque dentre as apresentações de San Antonio 2016 (tabela abaixo).

Nanda R et al. KEYNOTE-012: Long-lasting responses in a phase Ib study of pembrolizumab for metastatic triple-negative breast cancer (mTNBC). P6-10-03

PD-1 é um receptor expresso em linfócitos e está envolvido em mecanismos de bloqueio da resposta imune anti-tumoral. Pembrolizumabe é um anticorpo monoclonal anti PD-1 e através do “bloqueio do bloqueio”, possibilita que o sistema imunológico combata o tumor. Essa estratégia demonstrou atividade muito importante em melanoma, tumor de pulmão e diversos outros.
O estudo Keynote-012, que avaliou pembrolizumabe intravenoso na dose de 10 mg/kg a cada duas semanas em 32 pacientes com CMTN avançado (com tumores PD-L1 positivo), foi atualizado. As pacientes foram previamente politratadas, com mediana de três tratamentos para doença avançada (1-7), tendo a maioria acometimento visceral (78%). Ocorreram eventos adversos grau 3/4 em 19% das pacientes, sendo os mais comuns: artralgia, mialgia, fadiga e náusea; uma morte foi associada ao tratamento. Após 11 meses de mediana de seguimento, em 27 pacientes avaliáveis, a taxa de resposta global foi de 19%, incluindo uma resposta completa (RC=4%) e quatro respostas parciais (RP=15%). A taxa de benefício clínico (RC + RP + doença estável ≥ 24 meses) com pembrolizumabe foi de 22% (IC 95%, 9-42). Trinta e seis por cento das pacientes experimentaram alguma diminuição no tamanho do tumor. A duração mediana de resposta ainda não foi atingida. Duas pacientes continuavam a responder no momento da análise (128 semanas +). A sobrevida livre de progressão (SLP) mediana foi de dois meses (IC 95%, 2-6) e a sobrevida global (SG) mediana foi de 11 meses (95% IC, 5-18).

Rita Nanda, que apresentou o estudo, concluiu que “embora uma minoria de pacientes se beneficie de pembrolizumabe como agente único, apresenta um perfil de toxicidade favorável, e aquelas que respondem podem se beneficiar do tratamento por períodos prolongados de tempo”. Estudos de fase 3 em andamento comparam e combinam pembrolizumabe com quimioterapia.

Sacituzumab govitecan (IMMU-132), an anti-Trop-2-SN-38 antibody-drug conjugate (ADC) for the treatment of relapsed/refractory, metastatic triple-negative breast cancer (mTNBC): Updated results. P4-22-15

A utilização de uma nova estratégia: a combinação de um anticorpo com um quimioterápico numa mesma molécula mostrou benefício importante e aprovação de TDM-1 (Kadcyla) no tratamento de câncer de mama avançado HER-2 positivo. A mesma modalidade de combinação tem sido estudada em câncer de mama triplo negativo.

Sacituzumab govitecan (IMMU-132) é um conjugado anticorpo-fármaco que consiste no metabólito ativo de irinotecano, SN-38, ligado a um anticorpo IgG humanizado dirigido contra TROP-2, uma glicoproteína de superfície celular que é expressa em mais de 90% de CMTN.

O estudo recrutou 69 pacientes com CMTN metastático. Sacituzumab govitecan foi administrado na dose de 10 mg/kg nos dias 1 e 8 de cada 28 dias. As pacientes eram politratadas com uma mediana de cinco terapias anteriores (1-12). Os eventos adversos de grau ≥ 3 mais comuns foram a neutropenia (39%), com neutropenia febril ocorrendo em 7% das pacientes. A taxa de RC foi de 3% e a taxa de RP 28%, com benefício clínico de 45%. Globalmente, 70% das pacientes tratadas com sacituzumab govitecan tiveram alguma redução no tamanho do tumor. A duração mediana da resposta foi de nove meses (IC 95%, 6-11). A SLP mediana foi de seis meses (IC 95%, 5 -7) e a SG mediana de 17 meses (IC 95%, 11-21). Houve três respostas duradoras que variaram de 13 a 21 meses.

“Os resultados são realmente notáveis em um uma população fortemente pré-tratada”, disse a autora do estudo Linda T. Vahdat. Estudo de fase III encontra-se em andamento.

Câncer de mama triplo negativo avançado é uma área carente de novas terapias. Pembrolizumabe (já aprovado para outros tumores) e Sacituzumab Govitecan (que recebeu breakthrough designation pelo FDA americano) representam novas perspectivas para o câncer de mama triplo negativo avançado. Enquanto aguardamos estudos definitivos para ambos, duas questões importantes devem ser levadas em consideração: a busca (ideal) de biomarcadores de resposta (ou ausência de resposta) para melhor seleção assim como custos que permitam a utilização e disseminação dessas terapias.

Tabela 1: Resultados de eficácia de estudo com pembrolizumabe e sacituzumab govitecan em câncer de mama triplo negativo avançado

Pembrolizumabe Sacituzumab Govitecan
Número de pacientes 32 69
Mediana de tratamentos 3 (1-7) 5 (1-12)
Resposta objetiva 19% 30%
Benefício clínico 22% 45%
Sobrevida livre progressão 2 meses 6 meses
Duração mediana resposta Não atingida 9 meses

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