Linfedema: estado da arte

 

 

 

 

Por Dra. Anke Bergmann

É de conhecimento geral que o linfedema é uma das principais complicações do tratamento do câncer de mama. Além de ser uma condição crônica e evolutiva, quando não tratado, está associado a complicações funcionais, sintomatológicas e, como forma mais grave, ao desenvolvimento do linfangiossarcoma. Estudos recentes também têm demonstrado maior dificuldade de retorno ao trabalho dessas mulheres. Portanto, o linfedema afeta diretamente todos os domínios da qualidade de vida (QV), sejam eles funcionais, emocionais, de lazer, laborais ou sociais.

Nesse contexto, a ênfase deve ser na instituição de condutas preventivas. Seus principais fatores de risco estão associados ao tratamento oncológico. As consequências fisiopatológicas propostas após a lesão linfática inicial, provocada pela cirurgia axilar e/ou pela radioterapia, incluem o acúmulo de líquido intersticial rico em proteínas, adipogênese e consequente resposta inflamatória, definindo uma cascata de eventos moleculares. Esses eventos contribuem para a disfunção linfática direta ou indiretamente, promovendo fibrose tecidual, diminuindo o bombeamento linfático, prejudicando a formação linfática colateral e aumentando o extravasamento linfático. Entretanto, o tratamento oncológico é necessário para o controle local e sistêmico do câncer de mama e sua agressividade, depende do estádio e das condições do tumor e da paciente. Nesse sentido, as condutas de prevenção devem ser baseadas nos fatores modificáveis, como os cuidados com o membro afetado, a realização de exercícios e o controle do peso corporal.

No passado, as mulheres eram orientadas a evitar qualquer procedimento médico, exercícios com carga/resistência ou atividades que pudessem expor o braço a trauma, queimadura, alergia entre outros. Era necessária uma readaptação nos seus cuidados diários, nos cuidados médicos e nas suas atividades domésticas, laborais e sociais. Entretanto, essas orientações acabavam gerando sensação de incapacidade, fragilidade, medo de movimentar o braço (cinesiofobia), sintomas depressivos e angústia em relação ao futuro e, no desenvolvimento do linfedema, era comum a sensação de culpa e de arrependimento por ter realizado atividades que, supostamente, teriam levado ao linfedema. Mais recentemente, estudos demonstraram que não existe associação entre esses cuidados e o risco de linfedema, assim, as orientações devem ser focadas na prescrição de exercícios individualizados e no controle do peso corporal. Sempre que possível, devem ser evitados procedimentos invasivos no braço homolateral, principalmente a administração de quimioterápicos (tanto na neoadjuvância como na adjuvância).

O diagnóstico do linfedema é eminentemente clínico. Os exames de imagem devem ser reservados para diagnóstico diferencial com alterações venosas ou evolução tumoral. Não existe método de rastreamento e a detecção precoce é realizada por meio dos sintomas iniciais, como sensação de peso ou relato de edema, e pelo exame clínico (palpação, inspeção e volumetria direta ou indireta).

O tratamento fisioterapêutico deve ser instituído o mais precoce possível. O padrão ouro é a terapia física complexa (TFC), composta por drenagem linfática manual (DLM), terapia compressiva (enfaixamento, malhas compressivas ou vestimentas), exercícios ativos e cuidados com a pele. Ensaios clínicos randomizados tem demonstrado que a redução do volume do membro nos grupos que fazem a TFC com ou sem DLM é similar. Entretanto, ao adicionar a DLM no tratamento, é observado melhora dos sintomas e da QV dessas mulheres, além de diminuir o tempo do tratamento e aumentar a aderência a terapia compressiva. Outras condutas fisioterapêuticas podem ser utilizadas de forma adjuvante, mas não substitutiva, como taping, biofotomodulação, terapia por ondas de choque, acupuntura, oscilação profunda, entre outras.

As cirurgias também têm sido estudadas, tanto na prevenção como no tratamento do linfedema. As técnicas que utilizam o mapeamento linfático reverso e microcirurgia linfática, no momento da linfadenectomia axilar, tem demonstrado resultados promissores e parecem ser seguras em relação ao controle local e sistêmico do câncer de mama. No tratamento cirúrgico do linfedema, as técnicas mais utilizadas e envolvem as anastomoses linfovenosas e a transferência de linfonodos. No momento, não existem medicamentos específicos para o linfedema e somente são utilizados para tratar condições associadas.

Em conclusão, as ações de controle do linfedema devem ser instituídas ao diagnóstico de câncer de mama e precisam envolver abordagem multiprofissional, sendo fundamental a colaboração de cirurgiões, clínicos, nutricionistas, psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais e fisioterapeutas. A escolha das ações deve considerar as características individuais, as condições e estrutura do local de atendimento e as preferências da paciente.

Anke Bergmann. Fisioterapeuta, Doutora em Ciências da Saúde, Epidemiologista e Pesquisadora do Instituto Nacional de Câncer, Coordenadora Nacional da Pós Graduação em Fisioterapia em Oncologia/InterFisio, Editora Científica da Revista Brasileira de Cancerologia, Editora Especial – Fisioterapia da Mastology, Presidente da Associação Brasileira de Fisioterapia em Oncologia/ABFO, Coordenadora Científica do Espaço FisioLymph. Pode ser encontrada em www.fisiolymph.com.br