Genes relacionados à predisposição hereditária ao câncer de mama

Maria Isabel Achatz, Rodrigo Guindalini, Patricia Ashton-Prolla

O câncer de mama hereditário é responsável por pelo menos 10% de todos os tumores malignos na glândula mamária[1]. Variantes patogênicas nos genes BRCA1 ou BRCA2 são responsáveis ​​pela maioria dos casos de cancer de mama hereditário. Variantes patogênicas em genes de alta penetrância, como TP53, PALB2, STK11 e CDH1, conferem um risco acima de 45% para o desenvolvimento de cancer de mama ao longo da vida da mulher, e em genes de moderada penetrância, como CHEK2, ATM, NF1, NBN e BARD, podem conferir um risco de até 29%. Análise de DNA com painéis moleculares germinativos poderá identificar a variante patogênica que leva ao aumento do risco nas pacientes. [2][3] Hoje, devido à queda do custo deste exame e da educação dos especialistas quanto aos benefícios da identificação do paciente em risco, os testes genéticos passaram a fazer parte da clinica diária no cuidado da paciente com câncer de mama [4].

A Sociedade Americana de Mastologia publicou em Fevereiro de 2019 guidelines que orientam a realização dos painéis moleculares para todos os pacientes com câncer de mama. O aconselhamento genético é fundamental sempre que os painéis genéticos para identificação de variantes patogênicas que aumentam o risco para o câncer de mama forem solicitados[5]. Uma vez identificada uma variante patogênica em gene de predisposição ao câncer de mama, os benefícios para o paciente incluem a identificação de aumento de risco para um segundo tumor primário, além da definição de risco para a mama contralateral, ovário, pâncreas ou outros órgãos. Para cada um dos genes incluídos no painel, é possível oferecer medidas para o diagnostico precoce do câncer e, em alguns casos, a adenomastectomia redutora de risco (Tabela 1). Em pacientes com cancer de mama metastático, a identificação de variante patogênica que leve a inativação dos genes BRCA1/BRCA2  pode indicar uma melhor resposta a certas drogas e o benefício da medicina de precisão, por meio do uso de inibidores da PARP. Os benefícios para os familiares incluem a identificação daqueles em alto risco para desenvolver câncer e a possibilidade de início de rastreamento em idade jovem e cirurgias redutoras de risco em portadores assintomáticos[6].

Tabela 1: Genes relacionados à predisposição hereditária ao câncer de mama

 

Gene Risco Relativo Risco absoluto até 80 anos Manejo do risco para

Câncer de Mama

Adenomastectomia

redutora de risco

Outros riscos para cancer
BRCA1 11,4 75% – RNM mamas anual após 25 anos.

– Associar mamografia anual após 30 anos.

Sim, discutir a opção, riscos e grau de proteção Ovário (recomendar salpingooforectomia aos 35-40 anos)
BRCA2 11,7 75% – RNM mamas anual após 25 anos.

– Associar mamografia anual após 30 anos.

Sim, discutir a opção, riscos e grau de proteção Ovário (recomendar salpingooforectomia aos 40-45 anos)

Próstata, pâncreas.

TP53 105 ~70% – RNM mamas anual após 25 anos.

– Associar mamografia anual após 30 anos.

Sim, discutir a opção, riscos e grau de proteção Sarcoma, adrenocortical, sistema nervoso central, pulmão
CDH1 6,6 (cancer de mama lobular) 53% – RNM mamas e mamografia anual após 30 anos. Sim, discutir a opção, riscos e grau de proteção Câncer gástrico difuso
PALB2 5,3 45% – RNM mamas e mamografia anual após 30 anos. Evidência insuficiente, manejar de acordo com historia familial Pâncreas
STK11 NA 45% – RNM mamas anual após 25 anos.

– Associar mamografia anual após 30 anos.

Evidência insuficiente, manejar de acordo com historia familial Colon, pâncreas, tumores do cordão sexual/ estroma gonadal
CHEK2 3,0 29%  – RNM mamas e mamografia anual após 40 anos. Evidência insuficiente, manejar de acordo com historia familial Colorretal
ATM 2,8 27% – RNM mamas e mamografia anual após 40 anos. Evidência insuficiente, manejar de acordo com historia familial Ovário, Pâncreas
NF1 2,6 26% – RNM mamas e mamografia anual após 30 anos. Evidência insuficiente, manejar de acordo com historia familial Tumores da bainha de mielina, sistema nervoso central
NBN 2,7 23%  – RNM mamas e mamografia anual após 40 anos. Evidência insuficiente, manejar de acordo com historia familial Evidência insuficiente
PTEN NA NA – RNM mamas e mamografia anual após 30 anos Sim, discutir a opção, riscos e grau de proteção Tireóide, Endométrio
BARD NA NA Evidencia insuficiente, manejar de acordo com historia familial Evidência insuficiente, manejar de acordo com historia familial Evidência insuficiente

 

 

Fonte: NCCN Guidelines Version 3.2019 Genetic/Familial High-Risk Assessment: Breast and Ovarian, Easton et al. 2015[7] e Slavin et al. 2017[8].

É importante ressaltar que os resultados dos testes genéticos são complexos e, por isso, a U.S. Preventive Services Task Force (2019) recomenda que as mulheres que são submetidas a testes com painéis moleculares recebam aconselhamento genético pré- e pós-teste, para que um especialista que tenha conhecimento sobre as implicações do teste possa orientá-las durante o processo. Nem sempre os resultados do painel são de fácil interpretação, e presença de achados como variantes de significado incerto e presença de múltiplas variantes patogênicas não são incomuns. É importante que a paciente testada entenda também que um resultado negativo do teste com painel de genes (ausência de variantes) não exclui a possibilidade de que tenha predisposição hereditária ao câncer. Nesse momento há poucos estudos de custo-efetividade do uso de painel de genes quanto a análise apenas dos genes BRCA1/BRCA2. No entanto, a análise de um painel limitado de 7 genes, para os quais as condutas de manejo estão mais claramente definidas, parece ser custo-efetivo[9]. Uma melhor compreensão do espectro da suscetibilidade genética e o esclarecimento dos riscos específicos de genes para câncer de mama pode resultar em melhor identificação, definição de estratégias terapêuticas e prevenção para pacientes e suas famílias.

[1] Blackwood, M. A. & Weber, B. L. BRCA1 and BRCA2: from molecular genetics to clinical medicine. J. Clin. Oncol. 16, 1969–1977 (1998).

[2] Venkitaraman, A. R. Cancer susceptibility and the functions of BRCA1 and BRCA2. Cell 108, 171–182 (2002).

[3] Easton, D. F. et al. Gene-panel sequencing and the prediction of breast-cancer risk. N. Engl. J. Med. 372, 2243–2257 (2015).

[4] Easton, D. F. et al. Gene-panel sequencing and the prediction of breast-cancer risk. N. Engl. J. Med. 372, 2243–2257 (2015).

[5] Consensus Guidelines on Genetic. Testing for Hereditary Breast Cancer (2019)

[6] Domchek S. M. Risk-Reducing Mastectomy in BRCA1 and BRCA2 Mutation Carriers

A Complex Discussion. JAMA. 321(1):27 (2019)

[7] Easton DF(1), Pharoah PD, Antoniou AC, Tischkowitz M, Tavtigian SV, Nathanson KL,

Devilee P, Meindl A, Couch FJ, Southey M, Goldgar DE, Evans DG, Chenevix-Trench

G, Rahman N, Robson M, Domchek SM, Foulkes WD. Gene-panel sequencing and the prediction of breast-cancer risk.  N Engl J Med. 2015 Jun 4;372(23):2243-57. doi: 10.1056/NEJMsr1501341. Epub 2015

May 27.

[8] Slavin TP, Maxwell KN, Lilyquist J, Vijai J, Neuhausen SL, Hart SN,

Ravichandran V, Thomas T, Maria A, Villano D, Schrader KA, Moore R, Hu C,

Wubbenhorst B, Wenz BM, D’Andrea K, Robson ME, Peterlongo P, Bonanni B, Ford JM,

Garber JE, Domchek SM, Szabo C, Offit K, Nathanson KL, Weitzel JN, Couch FJ. The

contribution of pathogenic variants in breast cancer susceptibility genes to

familial breast cancer risk. NPJ Breast Cancer. 2017 Jun 9;3:22. doi:

10.1038/s41523-017-0024-8.

[9] Asphaug L, Melberg HO. The Cost-Effectiveness of Multigene Panel Testing for Hereditary Breast and Ovarian Cancer in Norway. MDM Policy Pract. 2019;4(1):2381468318821103. Published 2019 Feb 1. doi:10.1177/2381468318821103