Câncer de Mama Metastático Triplo-Negativo: finalmente temos drogas alvo?

O Câncer de mama triplo-negativo (CMMTN) constitui hoje o subtipo mais grave dos cânceres de mama. Embora diversos quimioterápicos tradicionais possam ter algum grau de atividade contra a doença metastática, o controle é pouco duradouro, e a expectativa de vida das pacientes é menor que dois anos.

Neste contexto bastante sombrio e sem avanços significativos, 2 estudos recentes trazem alento aos médicos e às pacientes com esta enfermidade. O primeiro deles foi apresentado no Congresso da Sociedade Europeia de Oncologia (ESMO 2018) o IMpassion 130, primeiro estudo de fase 3 a documentar benefício significativo de imunoterapia, sendo simultaneamente publicado no  New England Journal of Medicine (NEJM). O estudo randomizou mulheres com CMMTN na 1ª linha para receberem tratamento com nab-paclitaxel e placebo ou o mesmo nab-paclitaxel acrescido de atezolizumabe. Os resultados mostraram que, avaliando a população como um todo, havia um controle mais duradouro no grupo tratado com atezolizumabe associado ao nab-paclitaxel, embora a diferença na duração tenha sido modesta.  Analisando  exclusivamente as 185 pacientes de cada braço cujos tumores tinham a presença de PD- L1 nos linfócitos que infiltram o tumor (cerca de 40% do total) é que se encontrou algum benefício. O PD-L1 é o alvo do atezolizumabe. Neste grupo o benefício em termos de controle da doença foi maior, com uma redução do risco de progressão de 38% (o que significou um ganho de 2,5 meses) em favor da utilização do atezolizumabe. O resultado mais impressionante, no entanto, foi a redução de 38% no risco de morte (representando um ganho de 10 meses em termos de sobrevida global, 25 contra 15,5 meses favorecendo quem recebeu atezolizumabe). A aprovação desta combinação terapêutica pela agência norte-americana de medicamentos, o FDA, ocorreu no último dia 08 de Março de 2019. Já é possível testar no Brasil a expressão de PD-L1 nos linfócitos do tecido tumoral através de imunoistoquímica, usando o SP-142 exatamente como no estudo original.

O segundo estudo igualmente publicado no NEJM recentemente, envolveu uma estratégia inovadora nestas pacientes, o uso de um anticorpo conjugado à droga (CAD), uma estratégia tipo “Cavalo de Tróia” onde o quimioterápico (originalmente tóxico) é liberado diretamente na célula tumoral por um anticorpo monoclonal que se liga a um determinado alvo na superfície da célula tumoral. Essa estratégia já é conhecida, já que o T-DM1 é um CAD que libera a Emtansina após o Trastuzumabe se ligar à célula que hiperexpressa os receptores HER2. O Sacituzumabe-govitecan hziy (S-G) é um CAD que se liga ao receptor TROP 2, liberando o SN-38 (Govitecan é o metabólito ativo do Irinotecan) em altas concentrações nas células tumorais. Trop 2 é um transdutor de canais de cálcio trans-membrana que estimula o crescimento celular, sendo encontrado em 85% das pacientes com CMMTN. 108 pacientes portadoras de CMMTN refratário a pelos menos 2 terapias prévias receberam S-G em estudo fase I/II de braço único. 33% das pacientes tiveram respostas objetivas sendo que 3 pacientes entraram em remissão completa, e a mediana de duração das respostas foi de 9 meses em revisão independente, com benefício clínico alcançando 45% e sobrevida global de 13 meses. Em média as pacientes tinham recebido 3 linhas prévias de tratamento, algumas chegaram a 10 terapias! Diarreia e mielossupressão foram os efeitos adversos mais frequentes. Um estudo fase III confirmatório (ASCENT) está em andamento. São resultados absolutamente incomuns de serem obtidos em estudo de fase I/II com pacientes refratárias. A droga recebeu o aval do FDA como um avanço que merece especial atenção (breakthrough designation), mas ainda não está aprovada nem nos EUA. 

Referências:

  1. Schmid, S. Adams, H.S. Rugo et al. Atezolizumab and Nab-Paclitaxel in Advanced Triple-Negative Breast Cancer; N Eng J Med, June 201;
  2. Bardia A, Mayer I, Vahdat L et Sacituzumab Govitecan-hziy in Refractory Metastatic Triple-Negative Breast Cancer. N Engl J Med 380;8 February 21, 2019